Mestrando auxilia alunos da Educação Especial na criação de jogos de tabuleiro para aprendizado de História

Mestrando auxilia alunos da Educação Especial na criação de jogos de tabuleiro para aprendizado de História

O projeto de Vander Felipe Ortiz dos Santos auxiliou 20 alunos do Colégio Estadual Newton Guimarães na criação de jogos que auxiliam no aprendizado da História de Londrina

Estudantes da Educação Especial do Colégio Estadual Newton Guimarães tiveram a oportunidade de aprender sobre a História de Londrina de uma forma não convencional: com jogos de tabuleiro que eles mesmos criaram. A proposta faz parte da dissertação de Mestrado “O Ensino de História e a Realidade Local: A Criação de Jogos Analógicos como Recurso Didático na Educação Especial”, de Vander Felipe Ortiz dos Santos, do Departamento de História, que propôs uma abordagem pouco utilizada para alunos com alta habilidade e superdotação (AH/SD).

Vander Ortiz dos Santos é graduado em História pela UEL e possui Especialização em Game Design e Educação Especial com foco em altas habilidades. Ele também integra o Programa de Pós-graduação em História Social da UEL, é professor de História para alunos da Educação Básica, e explica que a ideia do tema para o seu Mestrado surgiu da suas experiências em sala de aula. “Desde o começo eu trabalho com oficinas para alunos de Educação Especial. E vi nessa área um local com muito potencial para o ensino de História, o que não é muito feito”, aponta.

O projeto é orientado pelo professor Alexandre Felipe Fiuza, pós-doutor em História Contemporânea pelas Universidade Autônoma de Madrid e Universidade Complutense de Madrid e professor no Departamento de História da UEL. Ele afirma que uma das preocupações ao longo do projeto foi a de que a criação dos jogos refletisse num maior domínio de uma consciência e de uma visão mais crítica da História. “Além da preocupação com a análise dos jogos criados, também foi importante analisar o percurso dos alunos neste processo, o que demandou também um viés de pesquisa de cunho etnográfico e da análise de conteúdo”, explicou.

“Projeto Impostor” e “Ocean War”

O eixo prático da pesquisa consistiu em oficinas nas quais, com o auxílio do mestrando, os próprios alunos criaram jogos analógicos com temáticas locais e históricas. Ao todo, Vander dos Santos conduziu 10 encontros realizados em cinco meses em duas turmas nos turnos da manhã e tarde, com cerca de 10 alunos cada. As reuniões ocorreram na sala de recurso do colégio, vinculada ao Núcleo de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação (NAS), e com material proveniente dos recursos da bolsa da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) de Vander.

Os alunos criaram dois jogos durante o projeto. Um deles, nomeado “Projeto Impostor”, passa-se no Museu Histórico de Londrina após um desastre fictício. A proposta é que os alunos interpretem personagens presos no museu e precisam trabalhar em equipe para escapar, utilizando objetos do acervo da instituição.

A caixa com as fichas do “Projeto Impostor”, feita pelos alunos do colégio.

“Nós fizemos um estudo sobre o acervo do museu, sobre qual é o sentido e objetivo de um museu, quais são os setores do Museu Histórico de Londrina, tudo isso para trazer para eles uma realidade local e entender que o museu faz parte da realidade deles e pode ser uma ferramenta no jogo”, explica Santos.

Outro, chamado “Ocean War”, é ambientado na Segunda Guerra Mundial, e os jogadores assumem os papéis de comerciantes que devem deixar Londrina e entregar suprimentos à Inglaterra enquanto fogem de submarinos inimigos.

“É legal trazer a esses temas que geralmente não conectam com a sua realidade local, a existência de Londrina, do Brasil, dessa visão de que a História é interconectada, que o que acontece na Europa não afeta só a Europa, afeta todo mundo, principalmente nesses grandes eventos”, contextualiza o mestrando.

O tabuleiro com o mapa do trajeto do “Ocean War”.
Base teórica

O trabalho de Vander dos Santos também contou com base teórica de autores como Jörn Rüsen, Peter Lee e Miguel Arroyo, que trabalham com o conceito da “consciência histórica”, que seria a percepção do indivíduo dentro do contexto histórico em que está inserido. “Então, ele (aluno) não vê Londrina como algo que já acabou, que a história londrinense já está pronta, que a narrativa londrinense é essa e a gente existe isolado disso. Não, eles fazem parte dessa narrativa, eles fazem parte dessa história, eles fazem parte desse desenvolvimento”, explica o mestrando.

A metodologia adotada por Vander incluiu análise de conteúdo a partir de relatórios dos alunos, registros dos jogos e das atividades desenvolvidas e, no caso do jogo Ocean War, dos diários de bordo. A proposta é que a partir desses relatórios, Vander analise e tire conclusões sobre a potencialidade do ensino de História através desse método. “Nós conseguimos tirar alguns aspectos de análise dos potenciais dessa metodologia. Vimos que pode ser detectado um aumento, por exemplo, na compreensão sobre o que é consciência histórica, o que é tempo, que a história é o estudo do ser humano através do tempo, que as coisas não têm permanência, as coisas se alteram”, expõe.

Entretanto, Santos explica que, ao mesmo tempo, não é possível tirar conclusões mais generalistas pelo pequeno recorte da pesquisa. O que foi observado na dissertação é que, na experiência do projeto os resultados foram positivos. “Eu até coloco na dissertação, isso não é uma proposta de substituição da sala de aula tradicional, porque a sala de aula tradicional vai ter outras dificuldades e outros desafios a serem vencidos. E tem competências da sala de aula tradicional que não são trabalhadas na oficina e vice-versa”, afirma, ressaltando que o projeto atende o critério 4 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, que é “Educação de Qualidade”.

Relevância

Para o professor Fiuza, a importância do projeto também se dá pelo maior cuidado com a heterogeneidade do público escolar, como no caso os alunos da Educação Especial. Ele explica que, apesar da escola apresentar uma homogeneização que tem seus benefícios, ela não pode deixar de considerar a maior consciência social sobre a neurodiversidade trazida pelo avanço científico. “Ainda que uma parte deles (alunos) devam ser atendidos por especialistas, a comunidade escolar deve cada vez mais estar preparada e ter condições materiais e humanas para um atendimento adequado à Educação Especial, cuja contrapartida do governo é de fundamental importância”, considera.

Atualmente, o projeto está em fase de finalização e análise de resultados, com previsão de defesa em agosto deste ano. Entretanto, apesar dos desafios que o projeto apresentou ao longo de sua proposta – como a evasão de alguns alunos devido ao conflito de horários e outras limitações – o mestrando disse que a experiência foi extremamente gratificante.

“Além de um projeto de mestrado, eu acho que foi uma coisa que impactou a vida de alguns estudantes. Então, acho que só por isso já vale a pena”, afirma Vander Ortiz dos Santos. – Foto: COM/UEL.

*Estagiário de Jornalismo da Coordenadoria de Comunicação Social.

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