Última grande geógrafa brasileira, Maria Adélia de Souza encerra evento na UEL
Última grande geógrafa brasileira, Maria Adélia de Souza encerra evento na UEL
Amiga pessoal de Milton Santos, a professora foi conferencista no evento de 65 Anos do Curso de Geografia. Com seis décadas de carreira, não pensa em se aposentar.“O produto da cidade teria que ser a civilidade. A verticalização é produto da especulação imobiliária”, diferencia a geógrafa e professora aposentada da Universidade de São Paulo (USP), Maria Adélia Aparecida de Souza. Aos 82 anos, 60 dedicados à carreira como geógrafa, especialista em planejamento urbano e docente, a professora participou do encerramento das comemorações dos 65 anos do curso de Geografia da Universidade Estadual de Londrina, na noite da última sexta (3), no Anfiteatro do Centro de Estudos Sociais Aplicados (Cesa).
Apontada como uma das últimas grandes geógrafas brasileiras, Maria Adélia de Souza considera que o Departamento de Geografia da UEL é um dos espaços acadêmicos que mais renderam reconhecimento e respeito à sua trajetória. “Aqui (na UEL) eu falo de Geografia. Aqui fui convidada para fazer uma seleção de um concurso público para a escolha de um professor, que é um aspecto muito importante pra mim”, lembra a professora. A relação com a cidade de Londrina, resgata, teve início antes mesmo da criação da UEL, ainda na década de 1960, na coleta de dados para a elaboração do seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) pela USP.
Convidada do Colegiado do curso da UEL, a professora realizou a palestra “Refletindo sobre a Terra, o Mundo e a Vida Humana”. Na ocasião, parabenizou a Universidade pela recriação do Departamento de Geografia. Até o ano passado, o corpo docente e os estudantes de graduação e pós-graduação integravam o Departamento de Geociências (CCE), que foi dividido em dois recentemente.
Mais cedo, a professora concedeu entrevistas, abordando conceitos eternizados pelo professor, amigo pessoal e parceiro intelectual, Milton Santos (1926-2001), a quem considera “o maior geógrafo do mundo”. “A cidade é produzida, ela é materialidade. Essa densificação, o Milton chamava isso de Meio Técnico Científico Informacional. Você tem que criar um meio denso tecnicamente, com fibra óptica, ruas asfaltadas e o ‘escambau’, e isso custa dinheiro. De onde você tira esse dinheiro? Da periferia. Isso é sistêmico”, explica, mencionando, também, que estes conceitos foram melhor elaborados e incluídos na Política Nacional de Desenvolvimento Urbano do Brasil, desenvolvida por ela a pedido do ditador Ernesto Geisel, em 1973.
À época, Maria Adélia atuava na Secretaria de Fazenda do Estado de São Paulo e havia acabado de retornar ao Brasil após uma década residindo na França. Na Universidade de Paris, foi aluna de grandes intelectuais, como o filósofo e escritor Jean-Paul Sartre (1905-1980), o economista Celso Furtado (1920-2004) e o geógrafo Pierre Monbeig (1908-1987), tendo se tornado mestre em Ciências Políticas, Econômicas e Sociais, e Doutora em Geografia Urbana. Já na USP, ocupou também os cargos de Prefeita do Campus e Chefe de Gabinete da Reitoria, entre outros.
“Eu fiquei vários dias pedindo para tomar um café com Jean-Paul Sartre porque eu tinha muita dificuldade em entender o existencialismo, até que um dia ele aceitou. Ele disse que a melhor maneira de entender era ir assistir às peças de teatro. Eu disse que não tinha dinheiro para ir ao teatro. Então, ele rapidamente tirou alguns ingressos do bolso e me deu”, conta.
Questionada sobre a sensação de estar completando 60 anos de carreira, a professora revela que não pensa em se aposentador, mencionando que está se dedicando à produção de duas novas publicações. Autora dos livros “A Identidade da Metrópole: a Verticalização em São Paulo” e “Governo Urbano”, é docente convidada da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e diz se orgulhar dos cerca de 150 mestres e 80 doutores que orientou e ajudou a formar. “E lhe digo mais: todos estão empregados.”