DaP: espaço de exposição, formação e arte contemporânea em Londrina

DaP: espaço de exposição, formação e arte contemporânea em Londrina

Espaço da UEL vem há décadas inserindo Londrina no circuito de arte contemporânea, além de servir de vitrine para trabalhos de estudantes.

Quem examinar com atenção a arte dos dias atuais será confrontado com uma desconcertante profusão de estilos, formas, práticas e programas. De início, parece que, quanto mais olhamos, menos certeza podemos ter quanto àquilo que, afinal, permite que as obras sejam qualificadas como “arte”, pelo menos de um ponto de vista tradicional.

Michael Archer

Desde as primeiras décadas do século XX, “arte” deixou de ser um adjetivo que indica que um determinado objeto é único, original, feito de materiais nobres, produto da “genialidade” de seu autor e que, por isso, sua existência deve ser preservada num templo especial, o museu, um espaço sagrado da arte. Picasso e Braque introduziram fragmentos de materiais banais em suas pinturas, como jornais, tecidos, entre outros. Marcel Duchamp, ao retirar objetos do cotidiano – como pá de neve e mictório – e expô-los em espaços apropriados para a arte, mostrou que o “artístico” não é algo próprio do objeto. O que garante que determinado objeto é arte não é o seu autor, nem algo imanente, mas o espaço onde ele se encontra e os discursos que o legitimam (do crítico, do especialista, do historiador da arte). De Duchamp em diante, os objetos do cotidiano invadiram as galerias. Num movimento paradoxal, quanto mais a arte se afastava do seu conceito tradicional e se aproximava da vida, mais o público se distanciava dela. 

A Divisão de Artes Plásticas (DaP) da Casa de Cultura da UEL é um espaço dedicado à arte contemporânea. A sua tarefa é criar condições que aproximem o público da arte. É o acesso frequente à produção artística contemporânea que nos dá a possibilidade de sermos afetados pela arte, de irmos ao encontro de nós mesmos, de nos sintonizarmos com o outro e com o contexto social em que vivemos, não pelos caminhos da razão, mas da intersubjetividade. Como relata a artista plástica e ex-estagiária da Dap, Thais Mitsunaga:

“A DaP experimenta. Enquanto percebemos amarras e travas no campo da arte e em seus espaços de exposição, temos a DaP que explora minuciosamente esses espaços e permite trabalhos que alternam a dinâmica do lugar, incorporam a experiência, o lugar de aprendizado, de conhecimento e autoconhecimento”.

Thais Mitsunaga, artista plástica e ex-estagiária da DaP
Visitantes interagem com o trabalho do artista Elcio Miazaki – Espaço reservado para possíveis
retornos (ou ‘como rasurar o ar’), feito com fitas de cetim e ferragens, que vem sendo feito
desde 2016. Exposição: Sobre o tempo, entre os pesos e voos das materialidades. (Fotos: Arquivo DaP)

Artes Visuais

Ativa desde 1992, mas fundada desde o ano de 1971, a DaP possui uma íntima conexão com o curso de Artes Visuais. É um espaço misto de galeria de arte e espaço de formação, destinado a exposições, mediações e oficinas de arte contemporânea. Também é a responsável pela organização do Arte Londrina, edital que recebe portfolios de trabalhos de artistas de diferentes pontos do país para serem selecionados para participarem das exposições durante o ano letivo.

A DaP é um dos poucos locais no Estado do Paraná dedicado a exposições de arte contemporânea. Tanto que o espaço transformou Londrina em um polo de discussão e produção, trazendo importantes artistas e críticos e fortalecendo o cenário cultural da cidade e da região. De forma gratuita e acessível, a DaP permite que se consolide um público formado não somente por universitários e artistas, mas também por estudantes da educação básica e os cidadãos das mais variadas idades, gêneros, etnias e classes sociais, democratizando o acesso a um tipo específico de arte que antes era centralizado apenas nas grandes capitais.

Oficina Orquestra de Desenho com artistas, pesquisadores e professores Aline Dias e Diego
Rayck.

Formação

Além da difusão da arte contemporânea, a DaP tem um papel fundamental no processo formativo dos estudantes do curso de Artes Visuais, de artistas e de estagiários que atuam dentro da divisão. Promove o contato direto e ativo, por meio de orientações sobre processos curatoriais, atividades de montagem e desmontagem de exposições, metodologias de cuidado e conservação de obras, logística de captação e devolução das produções, e a mediação entre as obras expostas e o público. Proporciona também aos estudantes do curso o reconhecimento das suas produções para além dos ateliês da UEL. Ao expor ao público a produção dos alunos, a DaP estimula o debate sobre a arte contemporânea entre os próprios estudantes, professores, artistas e público, incentivando a formação de novos artistas.

A importância da DaP reverbera na atuação dos estudantes e artistas mesmo após o fim das suas graduações. A atuação de muitos dos ex-alunos é um desdobramento de trajetórias formadas a partir da Dap. É o que relata Adolfo de Oliveira, hoje pesquisador na área de desenho e pintura, mas que passou pela divisão como mediador de exposição durante sua graduação.

“A DaP me permitiu ser o professor e profissional que sou hoje, constituiu em mim um modo de ver as obras de arte com maior generosidade e pensando nelas como geradoras de mudanças do campo das ideias, de como se entender no mundo e de compreender o próprio mundo à volta.”

Adolfo de Oliveira, artista e ex-aluno da DaP.

Leto William, artista plástico londrinense que hoje realiza seu terceiro mestrado na França, em uma das principais escolas de arte da Europa, é outro dos diversos nomes que passaram pela DaP. Mediador da Divisão durante sua graduação, Leto atribui parte do sucesso de sua trajetória graças à UEL. Ele afirma que os encontros proporcionados pela Divisão abriram portas para estudos, trabalhos e exposições em outros lugares ao redor do Brasil, e foram determinantes para seus estudos na França e seu crescimento profissional.  “Ainda hoje, a maneira como penso meu trabalho, que seja enquanto artista ou professor, é alimentada por essa primeira formação de excelência da DaP: a curiosidade, o engajamento e a responsabilidade com cada estudante estrutura o trabalho de cada um dos mediadores que por ali passou”, relata.

Entre as conquistas de Leto, destaque para a participação na exposição coletiva coup d’éclats no Museu do Louvre em junho de 2022, e a individual Travessia, no Centre Culturel Communal de Pierrefitte, em setembro do mesmo ano. Mas, ainda que esteja caminhando com sua carreira internacional, o autor reforça a importância da existência e manutenção da Divisão de Artes Plásticas para o cenário cultural de Londrina:

Trabalho da artista, professora e pesquisadora Elke Coelho, presente na exposição “Sobre o
tempo, entre os pesos e voos das materialidades”.

“Meu desejo é que ela possa continuar existindo e possibilitando outras histórias como a minha. Tenho a convicção de que Londrina, sem esse espaço de aprendizado e criação, se empobrecerá”, afirma.

Como se aproximar da “desconcertante profusão de estilos, formas, práticas” da arte contemporânea? Aprendemos a conhecer e apreciar a literatura lendo, a música ouvindo. Porém, o acesso a música e a literatura é bem mais fácil e estimulado do que o acesso as artes plásticas. Esse acesso não é um problema individual, mas social; é necessário exigir os meios de frequentação. E a UEL, por meio da DaP, tem garantido a todos, indistintamente, o direito à frequentação, à formação de público, professores e artistas voltados para a arte contemporânea.

A Divisão de Artes Plásticas da UEL fica na Rua Pernambuco, nº 540. A entrada é aberta a todos os interessados.

*Estagiária de Jornalismo na Casa de Cultura da UEL.

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