Estudo pretende identificar bactérias com potencial para o controle de doenças em tomateiros

Estudo pretende identificar bactérias com potencial para o controle de doenças em tomateiros

Um dos resultados que se pretende alcançar é redução da utilização de fertilizantes químicos nas lavouras de tomate

Seja numa deliciosa salada, como ingrediente indispensável de uma saborosa pizza, ou como elemento fundamental em molhos de apetitosas macarronadas, o tomate é protagonista na mesa de milhões de brasileiros. Mas poucos sabem como o cultivo dessa hortaliça-fruto dá trabalho, especialmente para afugentar de sua produção doenças, como a mancha, a murcha e a pinta bacterianas. O projeto “Caracterização e Seleção de Bacillus spp. para o Controle de Doenças Bacterianas e Promoção de Crescimento em Tomateiro” – coordenado pela professora do Departamento de Agronomia da UEL, Maria Isabel Balbi Peña – visa justamente combater essas bactérias prejudiciais ao tomate, utilizando outras bactérias.

As bactérias do gênero Bacillus destacam-se como agentes de controle biológico, pois são microrganismos antagônicos, ou seja, agentes que dificultam o desenvolvimento de patógenos, como outras bactérias ou fungos. Além disso, conseguem sobreviver por muito tempo em nichos ecológicos, devido à formação de endósporos – estruturas produzidas pelas bactérias para assegurar sua sobrevivência em condições ambientais adversas. Outras características relevantes das Bacillus spp. são promover o crescimento das plantas e induzir-lhes resistência sistêmica.

As atividades antagônicas de Bacillus spp. estão relacionadas à produção de metabólitos (substâncias produzidas durante o processo de transformação de alimentos em energia) com propriedades antibióticas, à produção de enzimas, ou de sideróferos, os quais complexam o ferro tornando-o menos disponível para fitopatógenos.

A promoção do crescimento do tomateiro através da ação das Bacillus spp. se dá de várias formas. Bacillus spp. produzem numerosos metabólitos que podem aumentar a disponibilidade de nutrientes para as plantas e, assim, promover diretamente o crescimento e o rendimento das culturas.  A biossíntese de fitormônio, cuja função é estimular o crescimento vegetal por espécies de Bacillus, também tem sido diretamente relacionada à promoção do crescimento em diferentes plantas.

O objetivo do projeto é justamente caracterizar e selecionar isolados de Bacillus spp. eficientes no biocontrole de doenças bacterianas do tomateiro e na promoção de seu crescimento usando uma abordagem baseada na caracterização in vitro (realizado em ambiente artificial, geralmente em laboratório), in vivo, no sistema planta-solo, e na análise genômica (dos microrganismos). Após os experimentos, pretende-se licenciar os isolados eficientes para obtenção de bioinsumos de uso comercial.

Metodologia

Sobre a metodologia, o projeto pretende fazer o isolamento da espécie Bacillus spp., que é um processo de separação a partir de uma amostra diversa de bactérias visando à obtenção de um grupo puro, de apenas um tipo. “Nós fazemos uma espécie de seleção da Natureza, de isolados ou de cepas de bacilos que estão naturalmente no solo. Depois, testamos essas bactérias que isolamos para ver se elas têm potencial de controle de doenças e de promoção de crescimento do tomateiro”, explica Maria Balbi.

Essa seleção se dará segundo alguns critérios, tais como: potencial antagônico frente às bactérias patogênicas Xanthomonas vesicatoria, à Ralstonia solanacearum e à Pseudomonas syringae pv. tomato, que causam, respectivamente, as doenças mancha-bacteriana, murcha-bacteriana e a pinta-bacteriana; potencial de promoção de crescimento do vegetal através da produção de ácido indol acético, solubilização de fosfato e fixação de nitrogênio; e potencial para produção de sideróforos, enzimas líticas, mobilidade tipo swarming (como enxame) e formação de biofilme.

Esses compostos e substâncias que as bactérias Bacillus spp. produzem trazem vantagens para o Bacillus na luta contra patógenos de planta. Por exemplo, os sideróforos se ligam fortemente ao ferro, um elemento essencial para diferentes processos biológicos envolvidos no desenvolvimento dos vegetais, como metabolismo do oxigênio, síntese de DNA e de RNA, e tornam possível sua solubilização e transporte para dentro da célula. Os sideróferos tornam o ferro menos disponível para fungos e bactérias fitopatogênicos (que causam doenças), já que estes geralmente não são capazes de produzir sistemas de transporte de ferro.

Já as enzimas líticas atuam degradando a parede celular de patógenos, especialmente fungos, o que leva à sua destruição e morte. Já a mobilidade tipo swarming é uma maneira de organização e movimentação de uma grande quantidade de bactérias. Essa mobilidade é especialmente importante na colonização eficiente de tecidos vegetais, permite uma movimentação coordenada por busca de nutrientes e propicia a formação de biofilmes. Estes são aglomerações de bactérias visando à proteção contra adversidades do ambiente, aumentando o potencial de biocontrole de alguns tipos de Bacillus. “Além dessas características desejáveis para o controle biológico, ou seja, para controlar outras bactérias através do seu potencial antagônico frente à bactéria fitopatogênica, esses isolados podem também solubilizar fósforo do solo que não está disponível para as plantas e eventualmente realizar a fixação do nitrogênio e liberar amônia também”, afirma a professora.

Professora Maria Balbi: “O intuito final é colocar esses isolados no mercado através de licenciamentos para que empresas desenvolvam bioinsumos para a agricultura” (Foto: Agência UEL)

Vencida essa etapa de seleção dos melhores isolados, o projeto prevê determinar in vivo o controle da mancha, murcha e pinta bacterianas e o efeito sobre o crescimento do tomateiro. “Constatado que existe um antagonismo in vitro, testamos aquelas bactérias com potencial antagonista em experimentos in vivo. E aí nós infectamos a planta com as bactérias que causam doença e aplicamos a bactéria antagonista para ver se tem um controle, uma redução da doença”, explica Maria Balbi.

Benefícios

Ao final de toda a execução do projeto, intenciona-se colher como resultados benefícios sociais, econômicos, ambientais, tecnológicos etc., tais como: aumento da produção da cultura do tomate através do combate às doenças bacterianas; redução da utilização de fertilizantes químicos nas lavouras através de maior uso de produtos de biocontrole, reduzindo a poluição ambiental; redução de custos de produção com bactericidas químicos; proteção à saúde dos trabalhadores rurais em decorrência da sustação ou diminuição do uso de agrotóxicos; desenvolvimento tecnológico, através do licenciamento de isolados para produção de biofertilizantes. “O intuito final é colocar esses isolados no mercado através de licenciamentos para que empresas desenvolvam bioinsumos para a agricultura”, diz a coordenadora do projeto.

O projeto está em sua fase inicial e foi contemplado com o “Programa de Bolsas de Produtividade em Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico”, promovido pela Fundação Araucária, conta com estudantes bolsistas e tem parceria com o Instituto de Desenvolvimento Rural (IDR) do Paraná. Sua importância reside no fato de que as doenças bacterianas, em geral, são de difícil controle. “Há o controle preventivo, mas não existem produtos que funcionem bem para o controle da doença, uma vez instalada na plantação. Então, o controle biológico poderia ser uma ferramenta importante para controlar essas doenças. A murcha, por exemplo, é basicamente uma doença que não se consegue controlar. Muitas vezes ela acarreta o encerramento das atividades porque o produtor não consegue produzir com essa bactéria no solo, ilustra Maria Balbi.

A coordenadora do projeto chama a atenção para um outro benefício que o estudo poderia resultar. A produção de fertilizantes sintéticos é muito cara e envolve a queima de combustíveis fósseis para sua síntese, o que gera danos ambientais, conforme explica Maria Balbi: “Se pudermos substituir os sintéticos pelos biofertilizantes com a mesma eficiência, nós já ganhamos muito porque se evita a produção do sintético”.

Maria Isabel Balbi Peña é Doutora em Agronomia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Atualmente é professora Associada do Departamento de Agronomia da UEL e atua como docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Agronomia, do qual é vice-coordenadora. Atua em pesquisas na área de controle biológico de doenças de plantas, manejo de doenças e fitobacteriologia. Tem orientado 6 estudantes de Doutorado, 10 de Mestrado e mais de 25 alunos de Iniciação Científica. É membro da Diretoria da Sociedade Brasileira de Fitopatologia e cofundadora do grupo “Mulheres na Fitopatologia” do qual foi coordenadora na gestão 2019- 2021. Dentre outros objetivos, o grupo desenvolve ações para a correção de fatores de desigualdade na carreira de mães e pais cientistas.

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