Projetos conjuntos da Agronomia e Computação utilizam Inteligência Artificial contra ferrugem asiática
Projetos conjuntos da Agronomia e Computação utilizam Inteligência Artificial contra ferrugem asiática
Doença é causada por um fungo (Phakopsora pachyrhizi) que surgiu no Brasil em 2002 e se tornou a principal praga da soja no país.Dois projetos de pesquisa uniram as áreas de Agronomia e Ciência da Computação para utilização de Inteligência Artificial no combate à ferrugem da soja, também conhecida como ferrugem asiática. A doença é causada por um fungo (Phakopsora pachyrhizi) que surgiu no Brasil em 2002, espalhou-se rapidamente e se tornou a principal praga da soja no país, chegando a causar bilhões de reais em prejuízo numa única safra, como aconteceu em 2005/2006.
Os sintomas mais característicos aparecem nas folhas, que começam a apresentar pequenos pontos de cor mais escura, até que mudam de cor completamente e caem. As primeiras lesões aparecem poucos dias depois da infecção e o fungo espalha seus esporos pelo vento. É justamente na coloração das folhas como sintoma que está o foco de um dos projetos de pesquisa.
É como se o olhar de um observador (um agrônomo ou um produtor, por exemplo) fosse ampliado e melhorado inúmeras vezes. Um dos projetos pesquisa o nível de severidade da doença observando a coloração, mas com base em pixels, ou seja, unidades fundamentais de uma imagem digital. A palavra deriva da junção de picture e element, e designa uma unidade com três cores básicas – as mesmas da televisão: vermelho, verde e azul. Cada cor possui 256 tonalidades, o que fornece até 16 milhões de combinações.
Esta quantidade de dados é que alimenta a Inteligência Artificial, programada para identificar as cores e calcular o nível de severidade da doença nas folhas. O projeto coletou 70 imagens de plantas de soja com 80 mil pixels e verificou sete níveis de severidade. O algoritmo criado respondeu com 93% de precisão, ou seja, em todos estes casos o pixel apontou corretamente o nível de severidade da doença na planta, em comparação com padrões já conhecidos. A conclusão dos pesquisadores é que é possível criar um modelo confiável baseado nesta ferramenta.
Um dos problemas que muitos pesquisadores da IA enfrentam é conhecido como “problema da caixa preta”. É que embora a IA forneça os resultados esperados e positivos, não se sabe exatamente como ela o fez, o que pode ser uma dificuldade quando se deseja reproduzir os testes. Mas como explica o professor Alan Salvany Felinto (Computação), é possível superar o problema. “A Inteligência Artificial resolve “um monte de ‘se’” de forma rápida e complexa, e a grande quantidade de dados é que garante a confiabilidade”, diz. A palavra chave que explica o sucesso da ideia é “calibrar”. Corretamente calibrada, a IA pode fazer isso e muito mais, assegura o professor Alan.
Já pelo lado da Agronomia, a pesquisa apresenta um outro grande mérito: o alto nível de objetividade, que se traduz num igualmente alto nível de confiabilidade nos resultados, já que não envolve justamente o fator do olhar humano. “Ganha-se muito evitando a subjetividade”, afirma o professor Alan. Já o professor Marcelo Giovanetti Canteri (Agronomia) lembra que existem vários tipos de controle de pragas, como o químico e o biológico, mas este modelo, que utiliza a IA, apresenta uma confiabilidade muito maior. “Todo avanço é bem vindo. A automatização representa menos perdas, porque é mais rápida e mais eficiente”, comenta.
Participam do projeto Murilo Caminotto Barbosa (Mestrado em Ciências da Computação) e Lucas Henrique Fantin (Doutorado em Agronomia), respectivamente orientandos dos professores Alan e Marcelo.
Smartphones – O segundo projeto estuda a utilização de imagens obtidas por smartphones para observar a saúde da planta de soja, tendo como referência os mapas NDVI (sigla em inglês para Índice de Vegetação por Diferença Normalizada). Trocando em miúdos, significa medir a saúde das plantas como base na reflexão de luz (solar) apresentada por elas. O grande avanço aqui é usar os smartphones comuns para isso, ao invés de radiômetro, um equipamento pesado e que custa 3 mil dólares.
Este projeto começou como um trabalho de conclusão de curso de graduação e continuou na pós-graduação. Foi desenvolvido na plantação de soja da Fazenda Escola da UEL e coletou 99 amostras (imagens) que, comparadas aos padrões preestabelecidos do NDVI, apresentou 97% de precisão. Ou seja, elas são tão eficientes quanto as do radiômetro, com as vantagens óbvias de serem obtidas por um aparelho popularizado, mais leve e mais barato.
Outra vantagem sobre o radiômetro, conforme explicou o professor Marcelo, é a possibilidade de obter as imagens em diferentes condições ambientais, o que naturalmente fornece mais dados para a IA atuar melhor. Com o radiômetro, ele conta, era feita apenas uma medição de luz por dia, normalmente bem cedo. Com os smartphones, os pesquisadores puderam produzir imagens em três horários (mas poderiam ser muitos mais), enriquecendo o estudo com mais dados. Afinal, conforme o professor Marcelo, outros fatores podem interferir nos resultados: o tamanho da planta, a nebulosidade do céu, a latitude, a temperatura e até o “comportamento” natural da própria planta. Por exemplo: num horário quente do dia, a planta encolhe suas folhas para captar menos calor. Reduzindo a área banhada pelo sol, reduz a luminosidade que reflete.
Conclusão – A conclusão do estudo é a certeza da viabilidade do modelo. Com ele, um pesquisador ou profissional pode levar seu smartphone ao campo, produzir as imagens e lá mesmo obter os resultados. Segundo o professor Alan, o futuro do projeto é o desenvolvimento de aplicativos que ampliem as possibilidades de análise. Novamente ele lembra: tudo depende de “calibrar” adequadamente os equipamentos.
Além dos estudantes Murilo e Lucas, participam deste projeto os alunos Ana Carolina Sottana de Pádua (Computação) e Deryk Sedlak Ribeiro (Agronomia). Os professores informam ainda que a equipe está produzindo artigos para publicação em periódicos científicos, assinados pelos estudantes e orientadores.