Ambientalista alerta para destruição de sistemas naturais que regulam clima e energia renovável
Ambientalista alerta para destruição de sistemas naturais que regulam clima e energia renovável
O ambientalista pondera que não há outro caminho que não seja o debate, embora os problemas ambientais exijam uma postura mais arrojada dos governantesHá décadas, o professor Efraim Rodrigues, do Departamento de Agronomia do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da UEL, acompanha os desdobramentos das conferências da ONU sobre o clima. Com linhas de pesquisa voltadas à recuperação de áreas degradadas e à conservação silvestre, ele analisa agora as expectativas para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP 30), que começou esta semana, em Belém (PA), reunindo representantes de vários países para debater clima, florestas, oceanos e transição energética.
Para o pesquisador, autor de livros importantes da área como Ecologia da Restauração e Biologia da Conservação, difícil alimentar grandes expectativas sobre os desdobramentos da Conferência. Nestes 30 anos, tratados foram assinados, mas o ritmo para cumprimento de compromissos que resultem em sustentabilidade é insuficiente. “Concluo que é difícil organizar representantes de diversos países. Como é que você chega a um consenso com todas essas opiniões?”, aponta.
Por outro lado, o ambientalista pondera que não há outro caminho que não seja o debate, embora os problemas ambientais exijam uma postura mais arrojada dos governantes. Aumento de temperatura, surpresas com ventos, chuvas e ciclones representam apenas uma pequena mostra do mundo que sofre com desmatamento, alto consumo e práticas que não condizem com a necessidade de conservação dos recursos naturais.
Nessa entrevista à Agência UEL, Efraim Rodrigues alerta que o foco principal da COP 30, emissão de carbono, representa um problema mais sério do que a extinção de uma espécie ou outra. “A gente está falando de perturbar os mecanismos de aquisição e de distribuição de energia no planeta. E disso depende tudo. A nossa comida, a estabilidade da nossa infraestrutura. A cada semana temos um evento climático”, enfatiza.
Depois de mais de 30 anos lecionando, Efraim está no aguardo da aprovação do processo de aposentadoria. Atualmente concentra aulas em dias específicos. Reside em Curitiba, cultiva plantas, café e mantém o velho hábito adquirido nas últimas décadas de ter uma área para compostagem de resíduos orgânicos. Como ele gosta de sugerir, meio ambiente tem de ser por inteiro. Dessa maneira, boas práticas dizem muito.
Agência UEL – A COP30 vai ser realizada até o próximo dia 21, em Belém. O que esperar, de forma concreta, de uma reunião de líderes como essa?
Efraim Rodrigues – Sendo acadêmico e definindo o que você considera como resultado concreto. Compromissos? Já estamos na trigésima reunião, então temos uma história. Já fui mais adolescente, mais irreverente. Minha definição de resultado concreto já foi mais exigente. Então, eu já cheguei, por exemplo, a publicar em uma coluna, anos atrás. Fiz um gráfico da concentração de gás carbônico na atmosfera, plotei o que era, na época. A concentração só subia, não parava de subir. Então, nessa minha visão antiga, mais imediatista, é de questionar qual foi o resultado da COP.
Eu acho que a gente não pode ter muita esperança, muita expectativa de que teremos alguma mudança dramática do que vai acontecer. Bom lembrar que os Estados Unidos, recentemente, decidiram voluntariamente sair do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Os chineses agora estão adotando certa liderança ambiental e estão tomando medidas concretas. Quem sabe, talvez eles exerçam essa liderança. Assim, olhando agora com um pouco mais de maturidade, concluo que é difícil organizar tantos países. Como é que você chega a um consenso com várias opiniões?

Agência UEL – Não acredita que possa existir uma opinião em bloco?
Efraim Rodrigues – Um país pode até influenciar a opinião de um outro. Por essa via soft, por negociação, mas não existe poder de força. É diferente de você imaginar as leis individuais de um país, por exemplo. Você não vai sair aqui no Brasil e matar um mico leão dourado porque você teme ser preso. Porque existe um monopólio da força, você tem polícia, você tem Judiciário, mas não existe essa relação entre os países. E talvez essa seja a dificuldade. Então, voltando na minha expectativa mais antiga, há 30, 40 anos. Os líderes que participam de uma COP gastam um monte de combustível de aviação, mas as negociações práticas sobre sustentabilidade não evoluem.
Por outro lado, é ali que o diálogo acontece. É ali que as coisas vêm caminhando a passos de tartaruga, porque a nossa expectativa é de ver alguma mudança de paradigma, alguma coisa concreta acontecendo. Mas é este o cenário onde as coisas andam. É preciso. Se não for aí, é por onde? O diálogo é o entendimento, é um processo, infelizmente mais lento do que a gente gostaria, mas é o andar possível com 170 pessoas tentando se entender, nenhuma delas com monopólio da força.
Agência UEL – Como estudioso e como ambientalista, dá para apontar quais são os principais problemas que as nações deveriam priorizar para ter um efeito desejável de redução de danos ambientais? Como vê isso, de uma forma prática?
Efraim Rodrigues – Vamos usar uma metáfora náutica. Você está em um barco a centenas de milhas da costa e aparece um furo no barco. Então, nesse momento, essa é a situação real. Nesse momento, não é relevante saber quem é o dono do barco, não é relevante saber quem vai trabalhar mais. De uma certa maneira, não é relevante saber como você vai resolver, o importante é resolver o problema. Enquanto isso não estiver resolvido, ninguém vai dormir.
Então, o que eu esperava que acontecesse? Que as pessoas percebessem isso, que percebessem a seriedade da situação que a gente se encontra. O foco principal da COP é a emissão de carbono. Trata-se de algo muito mais sério do que a vida do urso polar, do que a extinção de uma espécie ou outra. A gente está falando de perturbar os mecanismos de aquisição e de distribuição de energia no planeta. E disso depende tudo.
A nossa comida, a estabilidade da nossa infraestrutura. Acabamos de ver um furacão de uma força inesperada no Haiti. A cada semana temos um evento climático. A gente está meio como uma metáfora muito usada, do sapo na água que vai esquentando, que parece que nem é verdade, mas é uma história muito boa sobre como a gente vai se acostumando. Da mesma forma a gente vai achando normal estar em um barco furado a centenas de milhas da costa.
Agência UEL – De forma prática o mundo teria de mudar sua matriz energética? Isso é possível?
Efraim Rodrigues – A gente falou antes dessa liderança dos americanos, que aparentemente está sendo substituída pelos chineses agora. Os chineses instalaram em 2024 mais energia eólica e solar do que os norte-americanos têm. Esse tanto que eles aumentaram é mais do que os norte-americanos instalaram desde os anos 1970. Qual é o carro elétrico que você pensa em comprar? Ele é norte-americano ou é chinês?
Até talvez uns cinco, 10 anos atrás ele talvez seria norte-americano. Mas hoje se alguém pensa em comprar essa tecnologia nova, que pouca gente ainda tem, o predomínio é da indústria chinesa. Então, assim, é possível? É.
E não só é possível do ponto de vista ambientalista, do tipo larga tudo e vamos cuidar dessa emergência, vamos largar geração de empregos, largar a rentabilidade e essas preocupações. Tem empregos, tem negócios a serem feitos. Só precisa largar nossa mentalidade medieval. Certamente é possível gerando empregos, possível com rentabilidade, mantendo as regras do jogo atual.
Agência UEL – Isso não é uma utopia de alguém que é ambientalista e acadêmico?
Efraim Rodrigues – Muito pelo contrário, é uma questão concreta. Um colega meu, londrinense, mudou-se recentemente para a Alemanha. Por que ele saiu daqui? Ele queria ir para a Alemanha? Não, ele saiu porque não tinha emprego, porque não tinha condição e viu que na Alemanha teria uma vida melhor. O que ele faz na Alemanha? Instala placa fotovoltaica em telhado de casas. Então, assim, a Alemanha pegou um homem capacitado, que está lá progredindo, melhorando.
Ele não poderia estar fazendo isso aqui no Brasil? Seria ótimo para o Brasil se ele estivesse ficado, fazendo instalação de placas fotovoltaicas, que é uma energia não poluente.
Agência UEL – E sobre os impactos ambientais que estão acontecendo? Você citou um furacão recente, no Haiti. Li recentemente sobre o aumento de quase um grau e meio na temperatura da Amazônia. O que você poderia dizer de impactos ambientais que estamos sofrendo?
Efraim Rodrigues – Motivada por situações como alta emissão de carbono temos o aumento da temperatura, por exemplo. Mas estamos diante de uma situação com infinitos, inúmeros desdobramentos. A Amazônia, que é uma polaridade na sociedade brasileira, o debate não tem de ser sobre botar gado lá, porque é uma atividade que gera emprego e renda. O Brasil precisa disso.
Fato é que Amazônia produz uma água. A Amazônia produz os rios voadores, que alimentam o que a gente chama de República da Soja, que não é brasileira só. É paraguaia, uruguaia, argentina. Esse gigantesco continente aqui no sul da América do Sul que produz soja, vive da água amazônica.
E se você for ver a emissão de carbono per capita dos amazônidas, vai perceber que é irrelevante. Isso é um dado do Imazon, muito interessante que eu aprendi ontem. Se você considerar quanto carbono a Amazônia emite por estar sendo desmatada e dividir pelo total de habitantes, a quantidade é superior à da população do Catar, um grande produtor de petróleo. Se você pega todo o petróleo que eles produzem, divide pelos poucos habitantes que tem lá, se fizesse a mesma conta para os amazônidas, eles emitem mais carbono. Agora veja que, neste caso, diferentemente do petróleo, é um carbono com um efeito enorme para nós, porque é um carbono que produz água, açaí, é toda uma indústria de alimentos com a floresta de pé. São possibilidades que estão sendo queimadas, diferente do petróleo que está lá a milhares de metros de profundidade e que, estando lá, não causa muito problema, nem muita solução.
Agência UEL – Desde os anos 90 você fala sobre consciência ambiental, que as pessoas deveriam manter hábitos simples como, por exemplo, uma compostagem. O que mudou? As pessoas, pelo menos, estão mais conscientes?
Efraim Rodrigues – Eu acho que as pessoas estão mais enterradas nos seus celulares. Essas coisas concretas não têm mais muito espaço na vida. Já que a gente está falando da COP30 e de emissão de carbono, essa produção urbana de resíduos, que é ouro, vai em grande medida para lixões, onde vai produzir chorume. Vai emitir metano, que é um gás de efeito de estufa muito pior do que o gás carbônico, 24 vezes pior. Esse é o caso do chumbo. Ouro virando matéria orgânica e misturando nos solos que estão desesperadamente precisando dessa matéria orgânica. Quem define se vai ser ouro ou chumbo são as pessoas.
O que eu vejo nas cidades é o caminhão de lixo continuando a passar, pegando aquela matéria orgânica que poderia ser compostada e macetando aquilo com materiais que poderiam ser reciclados. Ah, mas existe a coleta seletiva! Sim, que maravilha! Mas não em todos os bairros. Em alguma medida é reciclado. Tem dinheiro para ser ganhado aí. Têm casas para serem construídas com plástico reciclado dos saquinhos plásticos malditos do supermercado e de outras coisas que a gente usa. Plástico que ficou milhões de anos para ser feito e a gente usa em segundos e joga fora. Tirando a lata de alumínio, nossa taxa de reciclagem ainda é muito baixa.
Estamos chegando agora à história do carvão biológico. Tem uma usina em Mato Grosso sendo construída, pegando resíduos agrícolas e da agroindústria e transformando isso em carvão para ser incorporado em solos. Então é um insumo agrícola que eu, inclusive, como pequeno agricultor, estou também descobrindo as maravilhas do carvão biológico.
É mais um caminho para a gente pegar esses resíduos de elaboração de alimentos, da agroindústria, das podas de grama. A gente tem oportunidades. Passado o primeiro quarto do século XXI, eu esperava que as pessoas estivessem disputando essas fontes de carbono para ganhar dinheiro, para reciclar, para empregar isso na jardinagem urbana, na agricultura, seja lá aonde fosse. Mas, pelo contrário, eu não vejo uma situação essencialmente muito diferente de 30, 40 anos atrás.
