Memórias do 1º reitor da UEL: 17 cursos em quatro anos
Memórias do 1º reitor da UEL: 17 cursos em quatro anos
Cirurgião gástrico, Ascêncio Garcia Lopes, implantou a Faculdade de Medicina e foi desafiado a criar uma Universidade.Se Londrina é hoje uma cidade polo no atendimento de saúde é porque muitos médicos foram atraídos para a cidade nas últimas décadas, solidificando um atendimento especializado em várias áreas. Essa tendência teve início em 1966, com a criação e implantação da Faculdade de Medicina do Norte do Paraná. O curso foi criado a partir de forte pressão social, uma iniciativa da Associação Médica de Londrina (AML), presidida pelo cirurgião gástrico, Ascêncio Garcia Lopes.
Quando a UEL completa 50 anos de reconhecimento, é fundamental lembrar a história e o caminho percorrido pelos pioneiros para implantar uma Universidade na jovem Londrina, na época reconhecida pelos cafezais e pela abundância de perobas.
Nesta entrevista concedida em março de 2021, o primeiro reitor lembra fatos curiosos da criação da UEL. Aos 92 anos, ele admite que as decisões políticas daquela época eram menos contaminadas por debates ideológicos. Isso talvez explique a facilidade que os londrinenses conseguiram autorização e recursos financeiros para criar a UEL, adquirir a área do Campus Universitário e estruturar 17 novos cursos de graduação entre 1970 e 1974.
Outra curiosidade foi a construção do Campus. Uma empresa especializada foi contratada para elaborar o projeto e fazer a implantação dos Centros de Estudos. Aliás, as primeiras edificações foram o Centro de Ciências Biológicas (CCB), Centro de Ciências Exatas (CCE) e Centro de Ciências Humanas (CCH).
Agência UEL – O senhor era cirurgião gástrico e presidente da Associação Médica. Como se deu a criação do curso de Medicina?
Ascêncio – A cidade clamava por um curso de Medicina. Já existia Direito, Odontologia e o curso de Filosofia, Ciências e Letras. Na primeira reunião da Associação eu falei que a cidade queria a curso. Era nossa obrigação orientar esse pedido. Em um domingo, estava em casa, atrás da Catedral. Pela manhã um senhor bateu na minha porta e disse que tinha lido na Folha de Londrina sobre a criação do curso. Ele era pai do doutor José Roberto Ferreira, que havia instalado um curso no Rio de Janeiro. Achamos oportuno. Ligamos para o médico, que veio nos auxiliar. Aí veio a orientação que o correto era o estado fazer uma Fundação Estadual para criar e manter a faculdade. Com este estudo fomos a Curitiba. Nos auxiliou o deputado estadual Olavo Garcia Ferreira para falar com o governador Ney Braga. Apresentamos o estudo ao governador.
Agência UEL – Aparentemente parecem que as coisas eram mais fáceis. O senhor despachou com o governador e de pronto conseguiu?
Ascêncio – Verdade. Tudo era natural, não havia qualquer interesse político no meio. O que levamos para o governador foi um pedido, uma necessidade. Ele entendeu na hora. E disse: ‘Vamos fazer. E vamos assinar em Londrina’. E nós então de posse da lei, fizemos a Fundação com um representante do Estado, da Prefeitura e um da Associação Médica. Esse conselho dirigia a Fesulon.
Agência UEL – E a criação da Universidade?
Ascêncio – Procuramos terreno para estruturar a Fundação, foi aí que surgiu a grande ideia. Londrina tinha dois secretários de estado, Dalton Paranaguá e Orlando Mayrinq Góes, na Saúde e na Fazenda. A Fesulon era presidida pelo doutor Eber Soares Vargas. Foi então que localizamos a área onde hoje está a UEL. Mais de 47 alqueires. Levamos a proposta para o então governador, Paulo Pimentel. Dissemos que queríamos aquela área para instalar o curso de Medicina e futuramente uma Universidade. O Paulo veio a Londrina trazer o cheque. Eu fiz o negócio pessoalmente com os donos da fazenda, que moravam em São Paulo.
Agência UEL – Tínhamos os cursos fundadores. Como se deu a expansão?
Ascêncio – O clamor da sociedade aumentava. Eu me lembro de que havia grande participação dos clubes de serviço, a imprensa. Levamos o pedido de novo para o governador Paulo Pimentel. Assim surgiram as Universidades em Londrina, Maringá e Ponta Grossa. Ele criou as três. E aí acabei sendo nomeado reitor, a partir de uma lista elaborada pela Fesulon. Ele me escolheu. De 1970 a 1974 eu dirigi a Universidade. Neste período eu criei 17 novos cursos.
Agência UEL – Quem foi o responsável pela planta, pelo projeto arquitetônico do Campus Universitário?
Ascêncio –Eu fiz um concurso nacional para implantar a Universidade naquela área. E aí ganhou uma empresa de São Paulo, Bros dos Santos Laiteman. Eu disse: ‘Quero um projeto para instalar uma universidade com ciências biológicas, exatas e humanas. Só que não pode derrubar nenhuma árvore”.
Agência UEL – O senhor falou em 17 novos cursos. Como foi a escolha das áreas?
Ascêncio – Eu chamei a professora Yoshiya Nakagawara, da Geografia. Pedi um levantamento dos cursos que mais precisavam. Ela fez um levantamento que apontou as necessidades. O primeiro curso apontado foi de Engenharia. Mas eu criei primeiro o de Educação Física, por obediência à legislação da época. Depois vieram os outros 15.
Agência UEL – Naquela época não havia necessidade de autorização do governo?
Ascêncio – A Universidade naquele período tinha autonomia. E nós criamos todos os cursos dentro da UEL, não foi dependendo do governo. Nós pedimos para o governo que nos aumentasse o repasse, a verba de manutenção.
Agência UEL – Autonomia é importante até hoje, não concorda?
Ascêncio – Sim. Penso que a melhor é a experiência do estado de São Paulo. Há uma verba definida dentro do orçamento estadual. Uma lei garante este percentual. Aí as Universidades são autônomas para fazerem o que for necessário. É um valor fixado de acordo com a arrecadação do ICMS.
Agência UEL – O senhor disse uma vez em entrevista que Universidade é local de política universitária e não partidária. Por quê?
Ascêncio – Lembro que quando a área da UEL foi adquirida, colocamos o nome de Cidade Universitária Paulo Pimentel. Depois veio o doutor Oscar Alves e retirou o nome. Ficou Campus da UEL. O Paulo é que tinha dado tudo. O Oscar era ligado ao Ney Braga, era genro. Política partidária no meu período nunca existiu. Era somente o interesse da Universidade. Nunca fui filiado a partido político.
Agência UEL – E o futuro da UEL?
Ascêncio – Não há qualquer jovem que não pense na UEL. Essa marca no currículo de qualquer um tem peso extraordinário. Hoje temos uma Universidade grande, de destaque. Então penso que as novas gerações deverão valorizar essa condição. Sempre vão disputar para entrar na instituição.