Metodologias ativas para ensino na Veterinária

Metodologias ativas para ensino na Veterinária

Estudos de casos reais e ensino baseado em problemas são utilizados por professores do Ciclo Básico para preparar futuro médico veterinário.

Dois projetos de ensino de professores do Departamento de Ciências Fisiológicas (Centro de Ciências Biológicas) buscam maior participação dos alunos no processo de aprendizagem da Fisiologia e da Biofísica, disciplinas do Ciclo Básico fundamentais para a prática do médico veterinário, da anamnese à cirurgia.

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Edição número 1421
de julho de 2023
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Um dos projetos é “Aulas baseadas em casos em problemas para o aprendizado de Biofísica: uma perspectiva multidisciplinar”, coordenado pelo professor Mauro Leonelli. O outro é “Avaliação de casos clínicos e situações-problema em Medicina Veterinária para o estudo da Fisiologia dos Sistemas”, coordenado pela professora Maria Fernanda Rodrigues Graciano. Ele direciona o projeto à prática da disciplina que ministra no 1º ano de Veterinária, de apenas 30 horas – daí a ideia de oferecer mais aos alunos que acabaram de ingressar na Universidade. Já ela ministra uma disciplina no 2º ano, de 120 horas, mas aproveita para reforçar conhecimentos prévios e ampliar os saberes necessários. A parceria entre os dois docentes vai além da Academia, já que são casados. Os dois projetos começaram em 2021 e devem encerrar em 2024.

Mauro conta que percebeu um “choque” dos novos alunos, especialmente considerando as turmas que entraram durante a pandemia, ou seja, com ensino remoto. Maria Fernanda lembra: os alunos “entraram” na faculdade, mas não literalmente. Faltou aquele contato com o Campus, laboratórios, professores e colegas. Os dois professores comentam que os novos alunos podem sentir dificuldade de apreender os conhecimentos básicos, até porque existe uma expectativa de que vão entrar já mexendo com animais, o que não acontece. Muito menos aconteceu durante a pandemia.

Professores Maria Fernanda e Mauro: aliar metodologias é bastante motivador, e o fato de os alunos buscarem casos é sinal de sua produtividade e do êxito da proposta.

Para motivar os alunos e vencer as dificuldades, os professores investigaram e chegaram às metodologias mais ativas, conjugando aulas expositivas, ainda necessárias, com novas abordagens, como casos atendidos no Hospital Veterinário. “Nosso objetivo é usar a curiosidade natural e a energia dos alunos para buscar o conhecimento”, comenta Mauro.

A Biofísica é uma ciência interdisciplinar que aplica os conhecimentos da Física para compreender e solucionar questões da Biologia, da Fisioterapia, Zootecnia e da Medicina (entre outras áreas), em qualquer nível: molecular, celular, fisiológico, ecológico, reprodução, entre outros. Alguns exemplos: a circulação sanguínea é afetada pela gravidade; a respiração envolve a dinâmica dos gases; o coração e o cérebro possuem atividades elétricas; altas ou baixas temperaturas têm impacto na saúde humana ou animal. E assim por diante. O ponto em comum é que tudo se refere ao funcionamento dos organismos, seja em nível molecular, de tecidos, órgãos, qualquer um.

Daí a ênfase da professora Maria Fernanda: para entender qual a doença de um animal, é preciso conhecer como seu organismo funciona quando saudável, para daí detectar o que está errado. Em palavras mais técnicas, o estudante deve integrar os conhecimentos de Anatomia, Histologia, Biologia molecular, Imunologia e Patologia, entre outros, para entender como tudo funciona – ou deveria estar funcionando. “O conhecimento é compartimentado, por isso o que buscamos é desenvolver desde cedo o raciocínio clínico dos alunos”, destaca a professora. Isso significa ter a visão do todo. “Entender o básico para entender a doença”, acrescenta.

Para os alunos que participam do projeto, ele ajuda a fixar tais conhecimentos, e reflete na qualidade dos estágios.

De acordo com o professor Mauro, o projeto quer fazer isso sem se transformar em uma sala de aula, como se fosse apenas mais uma disciplina. Assim, visa também criar e manter um banco de problemas e casos que podem ser utilizados nas suas ou nas aulas de qualquer docente. Parte dos problemas vem da Literatura, mas o coordenador do projeto destaca que os próprios alunos gostam de contribuir e levar problemas ao grupo. Os problemas são então classificados (por complexidade), testados, avaliados e ajustados, quando necessário. Para resolvê-los, os estudantes vão à teoria e discutem entre si, sob orientação do professor.

Casos reais

Depois de passar pela disciplina de Mauro, eles chegam à de Maria Fernanda, quando trabalharão mais casos, reais. Vão ao Hospital Veterinário, alguns fazem estágio, consultam outros docentes do curso, procuram casos para avaliar. Ela reitera a ideia de que aliar metodologias é bastante motivador, e o fato de os alunos buscarem casos é sinal de sua produtividade e do êxito da proposta.
No caso da disciplina do 2º ano, teórico-prática, é possível trabalhar com grupos menores, promover estudos autodirigidos (com consulta a múltiplas fontes) e dar mais liberdade de abordagem e, por consequência, de aprendizagem. “Temos casos para todos os sistemas”, diz Maria Fernanda, referindo-se aos sistemas circulatório, neurológico, digestivo, reprodutivo etc.

Além do conhecimento científico específico, o professor Mauro destaca mais um, muito importante: as habilidades comunicativas. E lembra Maria Fernanda: o paciente do médico veterinário não conversa com ele, mas ele conversa com o tutor do paciente, por isso é fundamental desenvolver tais habilidades.

Contribuição

Para Rebeca Medeiros (5º ano de Veterinária), participar do projeto da professora Maria Fernanda contribuiu muito. Ela percebeu, durante o curso, que os conhecimentos básicos são cobrados nos últimos anos, e o projeto ajudou a fixar tais conhecimentos, ajudando até nos estágios. “No projeto se discute de tudo. E não se resolve o problema sem o conhecimento da Biofísica”, afirma. Segundo ela, ajudou até na “parte social” – ajudou-a a vencer a timidez que tinha nas primeiras aulas, teóricas.

Tiago Monteiro (2º ano) ecoa a contribuição para vencer a timidez. Percebida a necessidade de comunicar, ele foi ao HV, estudou, conversou, pediu orientação, e disse que entendeu a doença por entender a Fisiologia.

No meio do curso, Karine Fernanda (3º ano) comenta que foi uma das alunas que levou um “choque”, por passar no vestibular e não vir ao Campus para as aulas por causa da pandemia. As dificuldades com o ensino remoto foram compensadas pelas reuniões online semanais e o contato com estudantes, inclusive de outros cursos.
Outro concluinte, Willian Cutrim (5º ano), disse que sempre foi curioso e, diferente dos colegas, exercitou a comunicação desde o início, inclusive tornando-se monitor durante a período de ensino remoto. Ela avalia que as discussões no grupo trouxeram muito mais clareza e motivação nas aulas.

Já no projeto do professor Mauro, as gêmeas Samanta e Samara Lopes Sena (3º ano) enfatizaram justamente a visão proporcionada pela participação. Para Samara, o projeto deu uma nova visão à disciplina e à teoria estudada. Ela mencionou justamente aquela “visão clínica” desejada pela professora Maria Fernanda. Samanta concorda: o projeto alarga a visão, propicia um diferencial para os alunos. “É mais abrangente, mas direciona para as áreas. É motivador, dá uma visão mais clara”, comenta.

Frutos

Além da construção do banco de problemas e casos, que vão formar um conjunto de materiais didáticos disponíveis aos docentes, os projetos têm rendido mais frutos. Exemplo é a participação e publicação de trabalhos na Mostra Anual de Atividades de Ensino da UEL (Pró-Ensino), ano passado.

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