Desafios tecnológicos e jurídicos

Desafios tecnológicos e jurídicos

Projeto de Formação Complementar encara os inumeráveis fatos da vida comum que despertam interesse e demandam proteção legal.

É quase uma missão impossível imaginar uma situação cotidiana que não envolva tecnologia e direitos. Cada vez mais, os avanços tecnológicos criam novos fatos e exigem uma resposta dos operadores do Direito. É disso que se trata o Projeto de Formação Complementar coordenado pela professora Têmis Chenso da Silva Rabelo Pedroso (Departamento de Direito Privado), intitulado “Direito e Tecnologia: os desafios do Direito frente às mudanças recorrentes do desenvolvimento tecnológico”.

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Edição número 1432
de julho de 2024
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Só para dar alguns exemplos destes “novos fatos”, basta imaginar o caso de um blogueiro ou dono de um canal no YouTube que falece. Como (com quem) fica o patrimônio amealhado por ele? E quanto aos direitos autorais daquilo que produziu? E quanto à exposição de menores de idade em redes sociais? E os “influenciadores” mirins? Não se trata apenas de seu patrimônio e direito de imagem, mas também de aspectos relacionados à formação (a escola é sacrificada?) e mesmo saúde mental.

O PFC, que teve início em junho de 2020, foi concebido entre 2018 e 2019, quando a professora morou em Palo Alto, na Califórnia (EUA), e estudou em Stanford, no Vale do Silício, região que abriga as empresas que são referência mundial em empreendedorismo, inovação e tecnologia. “É intenso o volume de inovações, desde a educação básica, como testemunhei na escola dos meus filhos”, comenta Temis.

Inspirada neste cenário e pensando nas lacunas específicas do curso de Direito quanto a estes temas, ela propôs o projeto na volta ao Brasil. O PFC está em sua quinta turma e, segundo a coordenadora, “tem fôlego de sobra” em suas ações de disseminação de vínculos do Direito com o desenvolvimento tecnológico. Entre estas ações, estão aulas abertas a todos os interessados, ministradas não apenas por professores e pesquisadores, mas também operadores do Direito, engenheiros, médicos e empresários, entre outros.

As reflexões, discussões, estudos e investigações em torno das relações do Direito com a tecnologia são de uma amplitude que desafia qualquer pesquisador. Os temas vão da biopirataria às redes sociais; das terapias ao uso da imagem, entre outros, como inteligência artificial e arte, internet das coisas, direito ao esquecimento, e direitos trabalhistas em transporte de aplicativos. Assim, mobilizam desde leis em vigor há décadas, como o Código Penal Brasileiro, até situações factuais ainda não transformadas em lei. A coordenadora do PFC chama isso de “largueza de conteúdo”, enquanto explica que é o Direito que viabiliza o acesso à tecnologia, sempre com o objetivo de gerar o bem, e não ser nocivo.

Divulgação.

Spin off

A professora dá ainda mais exemplos: aplicações no agronegócio, no desenvolvimento de materiais (de construção ou outros), cidades inteligentes, Medicina digital, privacidade de dados pessoais, comércio online. Usando um termo comum no mundo das séries, ela anota que todos estes e outros usos tecnológicos “geram muitos ‘spin offs’, ou seja, desdobramentos.

Para ilustrar: o uso da inteligência artificial nos tribunais tem gerado muitas discussões – e problemas. Têmis conta um fato ocorrido nos Estados Unidos: um algoritmo adotado por um tribunal de lá proferia sentenças mais leves quando o réu era branco, quando comparado a réus negros. Um algoritmo racista? A professora esclarece: “A tecnologia não é tão neutra quanto se prega. Um algoritmo tem opinião, que é a opinião dos seus programadores. Isso sem falar de algoritmos dos quais se perde o controle. Há perigos. Existem inovações muito boas, outras ruins, outras enviesadas. Não são impessoais nem críticas”.

Outro desafio está na adaptação dos seres humanos diante de novas situações provocadas pelo uso de tecnologia, como o trabalho em casa (home office) e o lazer sem sair de casa. “O relacionamento interpessoal mudou, mediatizado pela tecnologia”, comenta a professora Têmis. Para ela, muitas habilidades foram perdidas, pela simples falta de prática, e muitas atitudes ainda precisam ser entendidas, “a partir do zero, sem referências, além das situações que simplesmente não são adaptáveis, com comportamentos que ainda precisam ser inventados”, argumenta. Um outro exemplo: a noção de “desconexão”. Por causa do celular ou dos aplicativos de mensagens, o trabalho acompanha o trabalhador ou empresário onde ele estiver – em casa, no cinema, na estrada, na praia, nas férias.

Ebook

Um importante fruto do PFC é o e-book “Direito e Tecnologia: contribuições ao pensar jurídico no cenário contemporâneo” (editora Vox Littera). O segundo livro está em processo de produção.

Outra relevante conquista, de acordo com a professora, é a criação de um “braço especializado” do Programa: a liga de Propriedade Intelectual – IntelectUEL. “Inscrita na primeira competição de propriedade intelectual promovida pela LAPI e ABPI, logrou ganhar o primeiro lugar na classificação geral, trazendo mais um reconhecimento a nossa Universidade e Curso de Direito”, relata Têmis.

“A tecnologia não é tão neutra quanto se prega. Um algoritmo tem opinião, que é a opinião dos seus programadores”, afirma a professora Têmis.

O projeto também está no Instagram (@direitoetecnologiaUEL) e bem recheado, com filmes, legislação e conteúdos gerados por IA, entre outros, todos para motivar o pensamento e a pesquisa. Além disso, são promovidas reuniões quinzenais com os participantes.

Atualmente, o projeto conta com alunos de graduação e pós-graduação lato e stricto sensu (mestrandos da UEPG e USP), além de colaboradores externos, de São Paulo (USP), Pará e estados do Nordeste. Já passaram pelo projeto médicos, agrônomos biólogos, administradores de empresas, advogados e engenheiros, assim como alunos de Economia e Design. Na avaliação da coordenadora, tais perspectivas de outras áreas às vezes causam algum estranhamento, mas é justamente aí que o PFC atua: num diálogo esclarecedor que amplia o entendimento de todos.

O PFC abre editais para participação e, neste aspecto, a coordenadora também comemora: um edital ofereceu 15 vagas e apareceram 100 inscritos. Com isso, há vários participantes voluntários, interessados em desenvolver seus estudos e trocar ideias.

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