Projeto monitora e analisa animais encalhados no litoral paranaense
Projeto monitora e analisa animais encalhados no litoral paranaense
Utilizando dados de laboratório da UFPR, projeto da UEL atua desde 2010 no monitoramento e análise de animais encalhados no litoral do PR.No ano passado, aproximadamente 2300 animais marinhos, na sua maioria aves, foram encontrados encalhados no litoral paranaense, com apenas 100km de extensão. Outras espécies como tartarugas, golfinhos, lobos marinhos e focas também foram registradas. Os dados são do Laboratório de Ecologia e Conservação da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Desde 2010, um projeto da UEL ajuda no monitoramento e na análise anátomo-patológica dos animais marinhos encalhados no litoral do estado, em colaboração com o Centro de Estudos do Mar da UFPR, Campus de Pontal do Paraná. De acordo com a professora Ana Paula Frederico Rodrigues, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva (CCA), coordenadora do projeto, há uma grande quantidade de dados já coletada e muitos estudos voltados não apenas para a determinação da causa mortis dos animais, mas todos os fatores envolvidos.
Em 2015, os pesquisadores passaram a atuar com o Projeto de Monitoramento de Praias (PMP) da Bacia de Santos (SP), em razão da exigência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) para estudos e monitoramento antes e depois da instalação de plataformas de petróleo na região. Segundo a professora Ana Paula, trata-se de uma área de 800km de litoral, de Santos a Laguna (SC). Havia 56 pessoas no projeto, na época.
A fase atual do projeto teve início em 2019, baseada no Sistema de Informação de Monitoramento da Biota Aquática (Simba), que reúne dados dos PMP de todo o Brasil: Santos, Campos/Espírito Santo, Sergipe/Alagoas e Potiguar. A coordenadora explica que o sistema já monitorou mais de 1 milhão de animais, e o projeto da UEL se ocupa de cerca de 25% deste total.
Essencialmente, os estudos se voltam para o impacto da ação humana no meio ambiente que levam à morte dos animais marinhos. É uma pesquisa extensa e difícil, segundo Ana Paula, pela falta de dados mais antigos. Até 2015, a coleta era semanal, depois passou a ser diária. “O impacto é muito evidente, e sabemos que existe relação, por exemplo, com a atividade pesqueira e com a dragagem do porto. Neste caso, diretamente, ou por causa dos elementos suspensos na ação”, explica. O monitoramento indicou, entre outros, a existência de chumbo em cetáceos (botos e golfinhos) que causaram lesões renais, e mercúrio. Entre outras possibilidades, está o consumo de peixes contaminados por peixes maiores. Os chamados “elementos-traço” (metais pesados) se acumulam e passam da presa ao predador.
A coordenadora do projeto da UEL aponta que não é um problema agudo, como uma epidemia que passa, mas que vem se desenvolvendo há anos, com a poluição e outros fatores. Ela destaca, por exemplo, a significativa quantidade de animais que morrem pela ingestão de plástico (embalagens vazias, tampinhas etc.) ou mesmo pedaços de redes de pesca velhas simplesmente jogadas no mar pelos pescadores.
Tartarugas, aves e botos
Camila Roberta da Silva Ribeiro é doutoranda e seu foco são as tartarugas verdes, uma espécie que pode chegar a 1 metro de comprimento e é vítima das redes da pesca de camarão no litoral paranaense. Ela explica que, normalmente, são tartarugas jovens, de 30 cm, que se enroscam. Muitas vezes, a rede fica presa na boca do animal, impedindo que ele coma e levando-o à inanição. Em outras, os pedaços se enroscam na nadadeira e não deixam que o animal volte à superfície respirar, provocando afogamento. Camila também está analisando dados estatísticos ligados à contaminação por elementos-traço e preparando dois artigos para publicação. Sua tese deve ser defendida ano que vem.
A professora Ana Paula acrescentou que existem ainda muitas doenças registradas, como a fibropapilomatose, que provoca múltiplos tumores e pode afetar órgãos internos, especialmente em tartarugas verdes jovens. Tudo isso, segundo ela, é consequência da redução da imunidade dos animais, por causa da contaminação química. “Uma tartaruga saudável talvez não contraísse a doença”, comenta.
Andressa Maria Rorato Nascimento também é doutoranda e prossegue seus estudos com aves, com que já havia trabalhado no Mestrado. Ela pesquisa a presença de um parasito renal bastante conhecido e busca relacioná-lo com a morte de aves migratórias que terminam nas praias paranaenses. A relação já foi confirmada pelos dados e, quanto maior a ocorrência dos parasitos, mas forte a relação ecológica, ou seja, do meio ambiente. Curiosamente, algumas aves migram da Europa e acabam adoecendo aqui.
A pesquisadora monitora mais de 50 espécies. A maioria são pinguins de Magalhães (navegador que primeiro os avistou, em 1520), também conhecidos como “naufragados”. Os dados estatísticos estão mostrando o impacto da contaminação de substâncias químicas, como derivados de petróleo, nas lesões encontradas nos organismos mortos. Andressa também prepara artigos para disseminação dos resultados.
Natália Gontscharow é estudante de graduação em Medicina Veterinária e o foco de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) são os botos cinza e outras três espécies de cetáceos afetados pela ação humana no oceano. Um exemplo está nas muitas lesões de pele causadas pelas redes enroscadas. Ou pior: na tentativa de tirar as redes, os próprios pescadores acabam cortando o animal. A estudante já comprovou que a ação antrópica é negativa e nociva às espécies. É uma pena, considerando as tantas histórias de que os próprios cetáceos auxiliam os homens nas pescarias. Além das lesões, Natália também estuda alterações em glândulas dos animais, que indicam doenças.
Resultados e perspectivas
Para Ana Paula, a grande quantidade de dados já coletados é muito importante, mas ainda são necessários muitos estudos. Segundo ela, a previsão é que o projeto dure de 18 a 30 anos, e deve prosseguir com estudos rigorosos sobre a saúde dos animais levando em conta também o tempo, assim como vírus, parasitos e outros agentes envolvidos. Até aqui, o projeto já rendeu, entre outros resultados, duas supervisões de pós-doutorado, 4 teses, 5 dissertações, 4 TCCs de graduação, 4 trabalhos de Iniciação Científica (IC) e 15 artigos. Outros ex-participantes ingressaram em mestrados e uma foi continuar seus estudos na França.
Ana Paula enfatiza que o projeto ganha muito com a interação, o caráter interinstitucional das pesquisas. Mas mais que isso, é um relevante fator positivo na formação acadêmico-científica do profissional. “O Laboratório contribui para a qualificação de uma área que possui demanda”, comenta a professora. E, ainda, vale como extensão, à medida que pode atuar para órgãos, entidades e empresas na melhor compreensão da fauna marinha.