Documentário aborda histórias de luta e resistência dos Avá-Guarani da região de Guaíra

Documentário aborda histórias de luta e resistência dos Avá-Guarani da região de Guaíra

Narrativa, dividida em três partes, fala dos registros históricos dos indígenas na Tríplice Fronteira e dos dramas de exclusão na região.

Alunos do Departamento de Comunicação participaram do lançamento do documentário “Este é o nosso Tekoha – Memória e resistência Ñande Kuera”, dentro da programação do 5º Simpósio de Comunicação Popular e Comunitária, que chegou ao fim na noite desta quarta-feira (10). Após a exibição do documentário, que tem 32 minutos e traz dezenas de depoimentos, os alunos iniciaram um bate-papo com o estudante de Medicina da UEL responsável pela mediação e tradução das entrevistas, Rodrigo Luís Tupã, que também é indígena Avá-Guarani. Outra exibição do documentário está marcada para esta quinta-feira, junto às comunidades participantes, na região de Guaíra, Oeste do estado.

Dividido em três partes, a narrativa tem início com os registros históricos da presença dos Avá-Guaraní no Brasil, na região conhecida como Tríplice Fronteira (Brasil, Paraguai e Argentina). Em seguida, a contextualização histórica dá lugar ao drama vivido pela comunidade da região, em constante ameaça de serem expulsos por parte de fazendeiros, lideranças e até moradores de Guaíra/PR.

Simpósio reuniu pesquisadores da área da Comunicação Popular e Comunitária de todo o Brasil (Agência UEL)

Exclusão e violência

Responsável por um emocionante depoimento, Ílson Soares, conhecido na região como Sabiá, deixou transbordar toda a frustração que paira sobre a comunidade acerca de um violento processo de exclusão dos indígenas que ganhou ainda mais corpo a partir de 2012.

“A partir da fundação da organização, os fazendeiros se articularam e retiraram os Guarani como se fossem gado, a gritos e tiros. Não foi só uma vez que isso aconteceu. Eles conseguiram ônibus para levar os fazendeiros e colocaram carro de som para dizer que uma área estavam sendo invadida por paraguaios, que a cidade de Guaíra iria se tornar terra indígena e que as pessoas seriam expulsas das suas casas. A partir daí, criou-se um preconceito e não encontramos mais empregos na cidade. Nossos alunos passaram a sofrer preconceito nas escolas. Quando saíamos nas ruas, jogavam o carro por cima. Tivemos mortes por atropelamento. De 2012 até 2015, a violência foi muito grande aqui na cidade”, disse, em 2018, à equipe liderada pelos professores Mônica Kaseker, do Departamento de Comunicação, e Wagner Roberto do Amaral, do Departamento de Serviço Social (Cesa).

Durante a conversa com alunos, Mônica explicou que Sabiá havia acabado de retornar de uma reunião tensa, em Brasília (DF). Ao ser questionado pela docente-entrevistadora, falou sem parar por cerca de uma hora deixando transbordar um sentimento apenas conhecido por quem vive um sentimento de luto constante e multifacetado. Ao perceber que amigos e demais membros da comunidade estavam perdendo a vontade de viver, Sabiá representou a dor da perda da terra, ou seja, do Tekoha dos Avá-Guarani.  

“Acabamos usando a narração do Sabiá como fio condutor desse roteiro. Uma hora de entrevista em que ele contou tudo o que estava acontecendo. É uma carga muito grande que fez com que nós nos déssemos conta da nossa responsabilidade de decolonizar os nossos processos”, disse a professora, após lamentar que ao menos 12 indígenas da comunidade haviam cometido suicídio no período entre a primeira e a segunda visita da equipe.

“Em dezembro, eles choraram pela ausência do seu Cláudio e do Santiago (indígenas mortos), mas eles perceberam que ambos permanecem. Suas histórias, suas vozes permanecem. É um material que provoca muita emoção”, disse o professor Wagner Roberto do Amaral, ao lado da professora Eloá Soares Dutra Kastelic.

Mônica Kaseker e Wagner Roberto do Amaral, ao lado de Rodrigo Luís Tupã e de Eloá Soares Dutra Kastelic (Foto: Letícia Arsolo).

Produção colaborativa

Produzido em meio a um processo colaborativo, através de oficinas e rodas de conversa com a comunidade, o documentário ainda aborda novas formas de resistência indígena nos dias atuais e perspectivas futuras. “Foi um processo muito importante. Quem aparece no vídeo, quem compõe o documentário, são as lideranças, são os nossos Chamoî, que a gente chama de mais velho, e nossas Chari’y, que a gente chama de mais velha, que estão passando o seu modo de ver para os mais jovens e, também, para os não-indígenas entenderem esse contexto. O projeto em si fala sobre memórias, conflitos, resistência, fala de fortalecimento da liderança”, comenta o estudante Rodrigo.

O documentário é uma parceria entre os projetos de Pesquisa “A produção audiovisual como articuladora de sentidos de identidade e interculturalidade” e de Extensão “O audiovisual para o fortalecimento da identidade indígena no processo educativo”, coordenados pela professora Mônica Kaseker, e do projeto “Conflitos e resistências para a conquista e demarcação de Terras Indígenas no Oeste do Paraná: os caminhos e as expressões do fortalecimento das lideranças e da cultura Guarani”, coordenado pelo professor Wagner Roberto do Amaral.

Nesta quinta-feira (11), o “Este é o nosso Tekoha – Memória e Resistência Ñande Kuera” será lançado em Guaíra-PR, junto às comunidades participantes.

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