Pesquisadores alertam sobre leite e derivados comercializados sem fiscalização sanitária

Pesquisadores alertam sobre leite e derivados comercializados sem fiscalização sanitária

O LIPOA é referência em análise físico-química e microbiológica da qualidade do leite. Tem parceria com 13 Secretarias Municipais da região.

Beatriz Botelho

Agência UEL


Queijo fresco, queijo maturado ou leite são produtos encontrados com facilidade na mesa dos brasileiros. O que muitos não sabem é que esses produtos têm a venda proibida por Lei, desde 1950, quando não recebem a inspeção de órgãos oficiais dos governos federal, estadual ou municipal. Apesar da proibição, pesquisas feitas pelo Laboratório de Inspeção de Produtos de Origem Animal (LIPOA), do Centro de Ciências Agrárias (CCA), mostram que a comercialização desses produtos informais, que não apresentam garantia de qualidade, portanto, oferecem risco à saúde humana, é feita com naturalidade, seja em comércios da cidade ou no ambiente virtual.

Em Londrina, por exemplo, 20% dos estabelecimento comerciais, como padarias, mercearias e mercados comercializam produtos informais, como mostra um levantamento feito pelo LIPOA. “Se o local não tinha, o proprietário sabia indicar onde encontrar o produto”, relata Rafael Fagnani, professor do Departamento de Medicina Veterinária e atual coordenador do Laboratório. “Em Londrina, uma cidade de 600 mil habitantes, é fácil encontrar esses produtos informais e que não são fiscalizados”, afirma.

A pesquisa de georreferenciamento foi realizada entre abril e dezembro de 2019, em todas as regiões da área urbana. Para conseguir a informação, estudantes de graduação e pós-graduação se passaram por clientes e visitaram estabelecimentos em busca desses produtos informais. Segundo o professor, as regiões Norte, Central e Sul da cidade são as que mais concentraram pontos de comercialização.

No ambiente online, a facilidade da compra não é diferente. Por meio do MarketPlace de uma rede social, foram feitas buscas por esses produtos em 26 capitais de estado e no Distrito Federal – raio de 200 km – no período de janeiro a dezembro de 2019. Os primeiros 100 resultados foram computados e incluíram desde leite cru, embalados e vendido em garrafas PET, queijos frescos, maturados, ovo, mel, salames e embutidos.

A maior comercialização foi identificada nas regiões Sul e Sudeste, onde 78% dos consumidores estão situados. A explicação, segundo o professor, é que há maior acesso à internet e à tecnologia nessas regiões e onde estão as capitais com maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país.

Levantamento realizado em 26 capitais e no Distrito Federal, no período de abril a dezembro de 2019. (Divulgação/Projeto).

Riscos – Para Rafael Fagnani, o grande problema da comercialização de produtos informais é que eles podem afetar a saúde humana, com risco de transmissão de doenças. A falta de controle de qualidade e as falhas no processo higiênico-sanitário podem levar, por exemplo, à contaminação microbiológica. A contaminação pode causar diarreia, infecções gastrointestinais e, em casos mais graves, doenças como tuberculose, brucelose (doença febril aguda) e listeriose (intoxicação alimentar), podendo levar a óbito.

O professor reconhece que há um vínculo afetivo com esses produtos e frases como “eu sempre comi e nunca me fez mal” são comuns. Por isso, reitera que é preciso promover o conhecimento e conscientizar os brasileiros. “A consciência sobre a proibição é uma fator protetor. Quem tem consciência, ao mesmo tempo, tem duas vezes menos chance de ter dor de barriga”, afirma o pesquisador em referência a outro levantamento do grupo de pesquisa – CONFIRA AQUI.

Um ponto importante que ele lembra é da imagem “natural” que esses produtos passam, em contrapartida aos produzidos industrialmente. “Existem um ‘pré-conceito’ que as coisas da indústria não são puras. É quando esses produtos ganham espaço. Eles são considerados isento de fraudes, puros, mas é o contrário. A qualidade é ruim não só do ponto de vista microbiológico, mas de lesar a boa-fé do consumidor, por exemplo, com a adição de água no leite. Por causa da ausência de fiscalização, o consumidor não tem garantias do que está levando para casa”, afirma.

Regulamentação – Produtos informais são diferentes de produtos artesanais. A produção artesanal começa a ser normatizada no país, como é o caso da Lei aprovada em 2015 no Paraná, que regulamenta a venda e a produção do queijo artesanal com identificação – denominação de venda e estabelecimento produtor, data de validade e lote.

“O objetivo é regulamentar as condições de produção para fornecer um produto inócuo, mas sem perda da identidade. Portanto, há garantia de qualidade em produtos artesanais que seguem os trâmites para legalizar a produção. Essa situação gera margem para que muitos informais se apoderem dessa nomenclatura indevidamente, mas continuam na ilegalidade, sem normas, sem garantias, sem controle de qualidade,” explica o professor da UEL.

Resultados das pesquisas e levantamentos in loco do LIPOA são disponibilizados no blog MilkPoint (Divulgação/Projeto)

Laboratório – O Laboratório de Inspeção de Produtos de Origem Animal (LIPOA) é referência em análise físico-química e microbiológica da qualidade do leite. Há 30 anos, o Laboratório tem parceria com 13 Secretarias Municipais da região para fazer o controle de qualidade do leite de amostras apreendidas pela Vigilância Sanitária. Também atua na área da extensão, com cursos e atualização para estudantes e profissionais que já atuam no setor, e presta consultoria a produtores e a indústrias de laticínio.

Além da publicação em periódico, os resultados das pesquisas feitas no LIPOA estão divulgadas em portais de notícias sobre o leite. O professor e pesquisador Rafael Fagnani tem uma coluna no MilkPoint, onde consegue traduzir os termos científicos para a realidade e o dia a dia da comunidade em geral, além de fazer alertas importantes sobre os derivados do leite.

Para ele, é essencial que a pesquisa feita na Universidade chegue até a população. “Meu objetivo nessa área de pesquisa é levar informação ao maior número de pessoas possível. É ficar próximo da população, para que recebam informações de qualidade e cientificamente fundamentadas”.

Atualmente, as pesquisas feitas na área de qualidade do leite conta com três estudantes bolsistas da Iniciação Científica, dois mestrandos, dois doutorandos e oito residentes. Mais informações sobre as pesquisas e atividades podem ser encontradas na página do LIPOA.

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